"Não sei o plural de quinta-feira", a chefe do centro de tratamento intensivo do hospital disse em voz alta enquanto escrevia uma declaração, ninguém na sala sabia o plural de quinta-feira, "é quintas-feiras ou quinta-feiras?", todos se perguntavam, a dúvida estava instalada, "quinta, quintas, quinta, quintas", todos médicos (e um fisioterapeuta), todos profissionais, todos de camisa social. Eu sabia o plural de quinta-feira, mas eu sou estagiária, uso tênis todos os dias e não posso mostrar que sei alguma coisa (nem português) ou ninguém nunca mais me ensina nada, é uma profissão muito hospitaleira, a medicina, muito agradável.
Ninguém precisa saber todas as regras de plural para salvar vidas, alguém pode dizer, e não era essa mesma discussão que tínhamos no ensino médio? Quando vou precisar saber calcular o volume de uma pirâmide? Quando alguém vai me perguntar novamente sobre a guerra no Paquistão ou me pedir para recitar todos os tipos de vegetação? Os computadores, hoje em dia, corrigem automaticamente os erros de ortografia e, se não corrigirem também, a gente fala que é "regionalismo", "neologismo", "liberdade de expressão", "abreviação" ou simplesmente "senso de humor". É verdade, ninguém nunca vai te perguntar nada, se você então fizer como eu, e nunca se levantar da cadeira durante sua jornada de trabalho, ninguém nunca nem vai saber que você está ali, e vão te perguntar menos ainda. Você pode cursar a escola, comprar seu diploma ou até mesmo pedir pro seu filho de cinco anos desenhar um diploma pra você, tanto faz, você vira adulto de qualquer jeito, você vira adulto e continua sem precisar multiplicar frações ou saber a diferença entre objeto direto e indireto, pode descartar quase tudo o que disseram que você precisava aprender e se especializar dentro de um pequeno assunto e só saber falar sobre aquilo, quer dizer, na verdade, você deve fazer isto! O mercado te quer assim, bem do jeito que você é, obcecado somente pelo que é importante, todos irão entender que se trata de mais de uma quinta-feira quando você falar "quintas-feiras" ou "quinta-feiras", não importa e, mesmo que importasse, você agora é adulto, ninguém vai te reprovar por causa disso, e eu te asseguro que essa é uma daquelas coisas que você pode morrer sem saber, pode mesmo, mas pega mal quando você está na frente do estagiário.
Acabou que ficou "quinta-feiras" mesmo.
sexta-feira, 5 de abril de 2013
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013
Três coisas difíceis
3 coisas difíceis sobre a vida:
1- o sentir
2- o não-sentir
3- o sentir mais ou menos
O sentir é difícil pelo medo que o envolve de, um dia, não se sentir mais. O sentir é bonito, porém perecível, o sentir não pode ser doado em feiras de caridade, como um saco de arroz ou uma lata de leite em pó, o sentir precisa ser consumido na hora. O sentir começa a partir do estímulo de um terceiro, mas é intransferível, ele pode ser recíproco e compartilhado, mas é indivisível, o sentir enche a barriga e satisfaz a fome, mas é sempre arriscado de se guardar na geladeira quando sobra um pouco do sentir depois do jantar; alguém pode comer o seu sentir por engano ou, se você esquecê-lo por tempo demais, o sentir pode facilmente se estragar. E, então, você não sente mais.
O não-sentir é difícil pois não tem um prazo determinado de validade, ele é resistente às traças e aos cupins, pode ser congelado ou colocado em um tabuleiro de assar, pode ser usado como isca para a pesca ou como capa de chuva, o não-sentir é versátil e você o encontra em qualquer lugar. O não-sentir carrega o sentir nos braços por toda a extensão do amor ou da vida, o não-sentir, muitas vezes, instala-se em um determinado local por tanto tempo que se confunde com o sentir. O não-sentir se mistura com o sentir quando sai da boca das pessoas, as pessoas falam e você não consegue diferenciar se aquilo é sentir ou não-sentir. O grande medo que paira ao redor do não-sentir é exatamente o de se passar a vida pensando que o não-sentir é sentir. O não-sentir é o disfarce, o sentir é o espetáculo (ambos uma mentira).
O sentir mais ou menos é o caminho do meio, é difícil seguir o caminho do meio. É difícil sentir mais ou menos quando o sentir está fresco e a preço de custo, é difícil sentir mais ou menos quando o não-sentir já se alastrou e se solidificou pelos caminhos por onde o sentir costumava passar. O sentir mais ou menos é difícil de ser explicado pois eu acabei de inventá-lo, não existe sentir mais ou menos.
1- o sentir
2- o não-sentir
3- o sentir mais ou menos
O sentir é difícil pelo medo que o envolve de, um dia, não se sentir mais. O sentir é bonito, porém perecível, o sentir não pode ser doado em feiras de caridade, como um saco de arroz ou uma lata de leite em pó, o sentir precisa ser consumido na hora. O sentir começa a partir do estímulo de um terceiro, mas é intransferível, ele pode ser recíproco e compartilhado, mas é indivisível, o sentir enche a barriga e satisfaz a fome, mas é sempre arriscado de se guardar na geladeira quando sobra um pouco do sentir depois do jantar; alguém pode comer o seu sentir por engano ou, se você esquecê-lo por tempo demais, o sentir pode facilmente se estragar. E, então, você não sente mais.
O não-sentir é difícil pois não tem um prazo determinado de validade, ele é resistente às traças e aos cupins, pode ser congelado ou colocado em um tabuleiro de assar, pode ser usado como isca para a pesca ou como capa de chuva, o não-sentir é versátil e você o encontra em qualquer lugar. O não-sentir carrega o sentir nos braços por toda a extensão do amor ou da vida, o não-sentir, muitas vezes, instala-se em um determinado local por tanto tempo que se confunde com o sentir. O não-sentir se mistura com o sentir quando sai da boca das pessoas, as pessoas falam e você não consegue diferenciar se aquilo é sentir ou não-sentir. O grande medo que paira ao redor do não-sentir é exatamente o de se passar a vida pensando que o não-sentir é sentir. O não-sentir é o disfarce, o sentir é o espetáculo (ambos uma mentira).
O sentir mais ou menos é o caminho do meio, é difícil seguir o caminho do meio. É difícil sentir mais ou menos quando o sentir está fresco e a preço de custo, é difícil sentir mais ou menos quando o não-sentir já se alastrou e se solidificou pelos caminhos por onde o sentir costumava passar. O sentir mais ou menos é difícil de ser explicado pois eu acabei de inventá-lo, não existe sentir mais ou menos.
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sexta-feira, 7 de dezembro de 2012
Já não há mais coração
O nosso amor é como aquele livro que você me deu e que eu nunca li,
perfeito na sua condição imóvel, tentador pelas possibilidades que
carrega, irresistível em seu formato, em sua leveza, em seu cheiro de
novidade, sem rugas, sem manchas, sem dobras, excelente para o comércio e
para a troca. Já o abri com cuidado uma vez ou outra, para ver se ainda
tinha cheiro, para ver se já não tinha traças, porém não me interessei
pela sua sinopse, nunca me atrevi a avançar da primeira página, aonde
está a sua dedicatória de três linhas, três linhas e ali jaz para mim o
romance inteiro.
Fantasio com uma leitura repleta de metáforas e mensagens encriptadas que você talvez gostaria que eu desvendasse, sonho com um livro fluido e empolgante que vou recomendar para os amigos e, depois, vou delirar de ciúmes pelo entusiasmo dos amigos, imaginando que, enquanto lêem, eles também estarão pensando em você.
As páginas do nosso livro não têm marcas de dedos, nem dos meus dedos e nem dos seus dedos, as palavras dos nosso livro não formam frases, formam lembranças distantes, daquelas lembranças que lembramos com carinho por não sabermos mais como realmente aconteceram, apenas queremos que sejam boas, apenas queremos que tenham existido de verdade, os parágrafos do nosso livro não têm pontuação, são sentidos pelo ritmo da leitura (ou da não-leitura), são feitos de mudanças e de vazios, e os vazios nunca são feitos para serem lidos - ou seriam os vazios as partes mais importantes da leitura?
O nosso amor está, sim, naquele livro fechado e aderido à prateleira que você me deu sem também ter lido. No início me pareceu um desperdício, um desserviço do amor para com a arte, uma pobreza ter um livro para nunca tocá-lo, uma afronta guardar palavras, esconder palavras, manter folhas e mais folhas de palavras em cativeiro. Não obstante, o livro manteve seu papel lúdico e, no seu silêncio, não destruiu nenhuma das nossas ilusões, nem as minhas ilusões e nem as suas ilusões, nosso livro parece mais livro enquanto continua fechado, pois acredito que, assim como eu, você tem medo de abri-lo e não gostar da história, e devo dizer que uma ilusão sempre vale mais do que uma leitura.
Fantasio com uma leitura repleta de metáforas e mensagens encriptadas que você talvez gostaria que eu desvendasse, sonho com um livro fluido e empolgante que vou recomendar para os amigos e, depois, vou delirar de ciúmes pelo entusiasmo dos amigos, imaginando que, enquanto lêem, eles também estarão pensando em você.
As páginas do nosso livro não têm marcas de dedos, nem dos meus dedos e nem dos seus dedos, as palavras dos nosso livro não formam frases, formam lembranças distantes, daquelas lembranças que lembramos com carinho por não sabermos mais como realmente aconteceram, apenas queremos que sejam boas, apenas queremos que tenham existido de verdade, os parágrafos do nosso livro não têm pontuação, são sentidos pelo ritmo da leitura (ou da não-leitura), são feitos de mudanças e de vazios, e os vazios nunca são feitos para serem lidos - ou seriam os vazios as partes mais importantes da leitura?
O nosso amor está, sim, naquele livro fechado e aderido à prateleira que você me deu sem também ter lido. No início me pareceu um desperdício, um desserviço do amor para com a arte, uma pobreza ter um livro para nunca tocá-lo, uma afronta guardar palavras, esconder palavras, manter folhas e mais folhas de palavras em cativeiro. Não obstante, o livro manteve seu papel lúdico e, no seu silêncio, não destruiu nenhuma das nossas ilusões, nem as minhas ilusões e nem as suas ilusões, nosso livro parece mais livro enquanto continua fechado, pois acredito que, assim como eu, você tem medo de abri-lo e não gostar da história, e devo dizer que uma ilusão sempre vale mais do que uma leitura.
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sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Perfume
Comprei um vidro do seu perfume e encharquei a minha casa de você, derramei você nos livros, nos travesseiros e nos lençóis, te derramei nos sapatos e te deixei grudar nas minhas meias, te espalhei pelos cabelos e pelas dobras do corpo, te misturei nas fontes de água e tomei banho com você, tomei banho de você. Tomei esse banho e depois não tomei nenhum outro mais, deixei o seu cheiro ressecar e formar crostas, deixei você cair da minha pele e virar poeira, parei de varrer a casa e tudo o que eu tenho virou também poeira.
Pensei que não era o bastante e resolvi te derramar ainda nas minhas roupas, nas roupas dos meus pais, dos meus avós, dos meus amigos, nas roupas que ficam expostas nas vitrines das lojas, nos tecidos sem forma que irão tornar-se roupas, nos fios de náilon, nas crianças chinesas, nas plantações de algodão, na máquina de lavar. Quero sete bilhões de pessoas cheirando à você. Quero sete bilhões de você cheirando à pessoas. Quero você cheirando à você, já gastei todo o perfume.
Pensei que não era o bastante e resolvi te derramar ainda nas minhas roupas, nas roupas dos meus pais, dos meus avós, dos meus amigos, nas roupas que ficam expostas nas vitrines das lojas, nos tecidos sem forma que irão tornar-se roupas, nos fios de náilon, nas crianças chinesas, nas plantações de algodão, na máquina de lavar. Quero sete bilhões de pessoas cheirando à você. Quero sete bilhões de você cheirando à pessoas. Quero você cheirando à você, já gastei todo o perfume.
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quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Caixas vs. envelopes
Estou rastreando pelo computador uma encomenda que enviei pelo correio, enviei quatro caixas e tenho medo que se percam no caminho. Meu plano original era enviar tudo dentro de envelopes pardos, comprei quatro envelopes na semana passada, mas só fui ver que minhas encomendas não cabiam nos envelopes quando estava já na agência, chovia muito do lado de fora e eram três e quinze da tarde, o correio fecha às quatro horas. Coloquei tudo de volta nos sacos e me preparei para sair em busca de envelopes maiores, não sei se existem envelopes maiores do que aqueles que eu tinha, eu teria que sair e procurar, mas, quando eu já estava com a mão esticada em direção à porta, o homem que trabalha no correio me chamou e disse para eu usar uma caixa, eu respondi que precisava de envelopes, ele me mostrou uma caixa e eu insisti que queria envelopes, "eu preciso de envelopes", foi o que eu disse, ele falou que os envelopes iriam rasgar, que minhas encomendas eram muito pesadas, eu segurei a caixa que ele me entregou e perguntei se ele vendia envelopes ali mesmo no posto de correio, ele disse que não, só caixas; olhei a caixa, olhei a chuva do lado de fora, neste exato momento um funcionário abriu a porta e deixou entrar um vento úmido e gelado na loja, que se fodam os envelopes, pensei, e resolvi usar mesmo as caixas. Minha encomenda era uma coisa séria, diziam as regras que eu deveria mandar tudo em envelopes, não importam as regras de quê, o importante é que decidi usar quatro caixas em vez de quatro envelopes, porém coloquei os envelopes vazios e pequenos demais dentro das caixas, queria que soubessem que minha intenção era usar envelopes.
O homem ficou contente, "como é bom poder ajudar as pessoas", foi algo assim que ele me disse, quer dizer, lembrando bem, foi exatamente isso o que ele disse, "como é bom poder ajudar as pessoas", estou agora pensando se era apenas um funcionário satisfeito ou se era um homem sensível que viu estampado na minha cara o tanto de ajuda que eu, de fato, precisava. Eu vivo precisando de ajuda, de ajuda e de envelopes, vendo assim, trocar meus envelopes por caixas era o melhor que o homem dos correios podia fazer por mim, mesmo eu não querendo caixas, mesmo eu querendo envelopes. Eu agradeci e peguei meu dinheiro para pagar o serviço, o homem segurou as notas com força e sorriu para mim, "quando você entrou pela porta eu soube que o que você precisava era mesmo de uma caixa", ele disse e é, é verdade, moço-dos-correios, hoje você acertou, mas às vezes eu preciso de mais do que envelopes ou caixas, o que você me sugere?
O homem ficou contente, "como é bom poder ajudar as pessoas", foi algo assim que ele me disse, quer dizer, lembrando bem, foi exatamente isso o que ele disse, "como é bom poder ajudar as pessoas", estou agora pensando se era apenas um funcionário satisfeito ou se era um homem sensível que viu estampado na minha cara o tanto de ajuda que eu, de fato, precisava. Eu vivo precisando de ajuda, de ajuda e de envelopes, vendo assim, trocar meus envelopes por caixas era o melhor que o homem dos correios podia fazer por mim, mesmo eu não querendo caixas, mesmo eu querendo envelopes. Eu agradeci e peguei meu dinheiro para pagar o serviço, o homem segurou as notas com força e sorriu para mim, "quando você entrou pela porta eu soube que o que você precisava era mesmo de uma caixa", ele disse e é, é verdade, moço-dos-correios, hoje você acertou, mas às vezes eu preciso de mais do que envelopes ou caixas, o que você me sugere?
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quarta-feira, 12 de setembro de 2012
Sobre a existência
Eu existo, ou quase existo.
Você existe, existe demais.
Existimos em tempos diferentes e em tempos iguais, você desde o início existiu mais do que eu e existe todos os dias, eu existo uma só vez no mês e, em certos meses, até mesmo me esqueço de existir, você não se esquece de existir nem nos minutos em que ninguém está prestando atenção na sua existência, faz questão de ocupar as horas por completo, é difícil encontrar um momento em que você não tenha existido - e você não existiu em vários momentos.
Há quantos anos você existe de verdade?
Se você tivesse começado a existir há alguns anos atrás eu teria escrito o seu nome vinte e cinco vezes em uma folha em branco e colado na porta do armário, naquele tempo eu iria me poupar de refletir sobre a sua ausência, ficaria satisfeita em saber o seu endereço, sobrenome e apelido, ficaria contente em existir paralelamente.
Você existe há mais tempo do que eu, isso é verdade, mas não existiu na hora certa, você resolveu existir de um jeito errado, resolveu existir por cima de mim, resolveu cobrir minha existência com a sua e existir em um espaço lotado aonde eu não posso existir também. Eu não posso deixar de existir além do que eu já não existo para abrir espaço para você existir ainda mais, os arredores da minha existência estão vazios, você poderia ter sempre existido por aqui.
Você existe, existe demais.
Existimos em tempos diferentes e em tempos iguais, você desde o início existiu mais do que eu e existe todos os dias, eu existo uma só vez no mês e, em certos meses, até mesmo me esqueço de existir, você não se esquece de existir nem nos minutos em que ninguém está prestando atenção na sua existência, faz questão de ocupar as horas por completo, é difícil encontrar um momento em que você não tenha existido - e você não existiu em vários momentos.
Há quantos anos você existe de verdade?
Se você tivesse começado a existir há alguns anos atrás eu teria escrito o seu nome vinte e cinco vezes em uma folha em branco e colado na porta do armário, naquele tempo eu iria me poupar de refletir sobre a sua ausência, ficaria satisfeita em saber o seu endereço, sobrenome e apelido, ficaria contente em existir paralelamente.
Você existe há mais tempo do que eu, isso é verdade, mas não existiu na hora certa, você resolveu existir de um jeito errado, resolveu existir por cima de mim, resolveu cobrir minha existência com a sua e existir em um espaço lotado aonde eu não posso existir também. Eu não posso deixar de existir além do que eu já não existo para abrir espaço para você existir ainda mais, os arredores da minha existência estão vazios, você poderia ter sempre existido por aqui.
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sexta-feira, 17 de agosto de 2012
Cinquenta e nove e meio
Você me liga e eu quero te contar do meu dia, a sua voz está fria e eu quero falar de amor.
Me esforço para que minha voz pareça tão indiferente e distante como a sua já é naturalmente, então falo exatamente o oposto de tudo o que estou pensando, só fico satisfeita quando a frase me parece bastante cruel aos seus ouvidos (acho que você aguenta), mas seu tom permanece inalterado, vejo que acha graça das minhas maldades, a sua risada morna esquenta a minha orelha pelo telefone, minhas crueldades de amor não têm efeito algum sobre você.
Quero entrar na sua voz. Quero morar na sua voz.
Quero gravar minhas iniciais com uma navalha nas suas cordas vocais - o nó que a gente deu ficou frouxo demais.
Eu gosto de te ouvir enquanto coleciono palavras. Sua voz é muito fácil de desmembrar. Antes mesmo de você ir embora eu já colecionava essas palavras. Estúpidas. Desesperadas. Viscosas. Essas palavras que eu sabia que deixaria de dizer. Tenho hoje tantas delas guardadas que me pergunto, com uma certa surpresa, sobre o que conversávamos.
Mas que tolice a minha, nós não conversávamos.
Me esforço para que minha voz pareça tão indiferente e distante como a sua já é naturalmente, então falo exatamente o oposto de tudo o que estou pensando, só fico satisfeita quando a frase me parece bastante cruel aos seus ouvidos (acho que você aguenta), mas seu tom permanece inalterado, vejo que acha graça das minhas maldades, a sua risada morna esquenta a minha orelha pelo telefone, minhas crueldades de amor não têm efeito algum sobre você.
Quero entrar na sua voz. Quero morar na sua voz.
Quero gravar minhas iniciais com uma navalha nas suas cordas vocais - o nó que a gente deu ficou frouxo demais.
Eu gosto de te ouvir enquanto coleciono palavras. Sua voz é muito fácil de desmembrar. Antes mesmo de você ir embora eu já colecionava essas palavras. Estúpidas. Desesperadas. Viscosas. Essas palavras que eu sabia que deixaria de dizer. Tenho hoje tantas delas guardadas que me pergunto, com uma certa surpresa, sobre o que conversávamos.
Mas que tolice a minha, nós não conversávamos.
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