sexta-feira, 5 de abril de 2013

Quintas-feiras

"Não sei o plural de quinta-feira", a chefe do centro de tratamento intensivo do hospital disse em voz alta enquanto escrevia uma declaração, ninguém na sala sabia o plural de quinta-feira, "é quintas-feiras ou quinta-feiras?", todos se perguntavam, a dúvida estava instalada, "quinta, quintas, quinta, quintas", todos médicos (e um fisioterapeuta), todos profissionais, todos de camisa social. Eu sabia o plural de quinta-feira, mas eu sou estagiária, uso tênis todos os dias e não posso mostrar que sei alguma coisa (nem português) ou ninguém nunca mais me ensina nada, é uma profissão muito hospitaleira, a medicina, muito agradável.
Ninguém precisa saber todas as regras de plural para salvar vidas, alguém pode dizer, e não era essa mesma discussão que tínhamos no ensino médio? Quando vou precisar saber calcular o volume de uma pirâmide? Quando alguém vai me perguntar novamente sobre a guerra no Paquistão ou me pedir para recitar todos os tipos de vegetação? Os computadores, hoje em dia, corrigem automaticamente os erros de ortografia e, se não corrigirem também, a gente fala que é "regionalismo", "neologismo", "liberdade de expressão", "abreviação" ou simplesmente "senso de humor". É verdade, ninguém nunca vai te perguntar nada, se você então fizer como eu, e nunca se levantar da cadeira durante sua jornada de trabalho, ninguém nunca nem vai saber que você está ali, e vão te perguntar menos ainda. Você pode cursar a escola, comprar seu diploma ou até mesmo pedir pro seu filho de cinco anos desenhar um diploma pra você, tanto faz, você vira adulto de qualquer jeito, você vira adulto e continua sem precisar multiplicar frações ou saber a diferença entre objeto direto e indireto, pode descartar quase tudo o que disseram que você precisava aprender e se especializar dentro de um pequeno assunto e só saber falar sobre aquilo, quer dizer, na verdade, você deve fazer isto! O mercado te quer assim, bem do jeito que você é, obcecado somente pelo que é importante, todos irão entender que se trata de mais de uma quinta-feira quando você falar "quintas-feiras" ou "quinta-feiras", não importa e, mesmo que importasse, você agora é adulto, ninguém vai te reprovar por causa disso, e eu te asseguro que essa é uma daquelas coisas que você pode morrer sem saber, pode mesmo, mas pega mal quando você está na frente do estagiário.
Acabou que ficou "quinta-feiras" mesmo.

Um comentário:

  1. Engraçado,tenho professores e colegas que escorregam tanto na gramática que fazem esse quinta-feiras não parecer nada. São os males da especialização.
    Gostei muito do seu blog, coloquei em meu blogroll.

    http://anarquicronismo.blogspot.com.br/

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