quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Caixas vs. envelopes

Estou rastreando pelo computador uma encomenda que enviei pelo correio, enviei quatro caixas e tenho medo que se percam no caminho. Meu plano original era enviar tudo dentro de envelopes pardos, comprei quatro envelopes na semana passada, mas só fui ver que minhas encomendas não cabiam nos envelopes quando estava já na agência, chovia muito do lado de fora e eram três e quinze da tarde, o correio fecha às quatro horas. Coloquei tudo de volta nos sacos e me preparei para sair em busca de envelopes maiores, não sei se existem envelopes maiores do que aqueles que eu tinha, eu teria que sair e procurar, mas, quando eu já estava com a mão esticada em direção à porta, o homem que trabalha no correio me chamou e disse para eu usar uma caixa, eu respondi que precisava de envelopes, ele me mostrou uma caixa e eu insisti que queria envelopes, "eu preciso de envelopes", foi o que eu disse, ele falou que os envelopes iriam rasgar, que minhas encomendas eram muito pesadas, eu segurei a caixa que ele me entregou e perguntei se ele vendia envelopes ali mesmo no posto de correio, ele disse que não, só caixas; olhei a caixa, olhei a chuva do lado de fora, neste exato momento um funcionário abriu a porta e deixou entrar um vento úmido e gelado na loja, que se fodam os envelopes, pensei, e resolvi usar mesmo as caixas. Minha encomenda era uma coisa séria, diziam as regras que eu deveria mandar tudo em envelopes, não importam as regras de quê, o importante é que decidi usar quatro caixas em vez de quatro envelopes, porém coloquei os envelopes vazios e pequenos demais dentro das caixas, queria que soubessem que minha intenção era usar envelopes.
O homem ficou contente, "como é bom poder ajudar as pessoas", foi algo assim que ele me disse, quer dizer, lembrando bem, foi exatamente isso o que ele disse, "como é bom poder ajudar as pessoas", estou agora pensando se era apenas um funcionário satisfeito ou se era um homem sensível que viu estampado na minha cara o tanto de ajuda que eu, de fato, precisava. Eu vivo precisando de ajuda, de ajuda e de envelopes, vendo assim, trocar meus envelopes por caixas era o melhor que o homem dos correios podia fazer por mim, mesmo eu não querendo caixas, mesmo eu querendo envelopes. Eu agradeci e peguei meu dinheiro para pagar o serviço, o homem segurou as notas com força e sorriu para mim, "quando você entrou pela porta eu soube que o que você precisava era mesmo de uma caixa", ele disse e é, é verdade, moço-dos-correios, hoje você acertou, mas às vezes eu preciso de mais do que envelopes ou caixas, o que você me sugere?

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Sobre a existência

Eu existo, ou quase existo.
Você existe, existe demais.
Existimos em tempos diferentes e em tempos iguais, você desde o início existiu mais do que eu e existe todos os dias, eu existo uma só vez no mês e, em certos meses, até mesmo me esqueço de existir, você não se esquece de existir nem nos minutos em que ninguém está prestando atenção na sua existência, faz questão de ocupar as horas por completo, é difícil encontrar um momento em que você não tenha existido - e você não existiu em vários momentos.
Há quantos anos você existe de verdade?
Se você tivesse começado a existir há alguns anos atrás eu teria escrito o seu nome vinte e cinco vezes em uma folha em branco e colado na porta do armário, naquele tempo eu iria me poupar de refletir sobre a sua ausência, ficaria satisfeita em saber o seu endereço, sobrenome e apelido, ficaria contente em existir paralelamente.
Você existe há mais tempo do que eu, isso é verdade, mas não existiu na hora certa, você resolveu existir de um jeito errado, resolveu existir por cima de mim, resolveu cobrir minha existência com a sua e existir em um espaço lotado aonde eu não posso existir também. Eu não posso deixar de existir além do que eu já não existo para abrir espaço para você existir ainda mais, os arredores da minha existência estão vazios, você poderia ter sempre existido por aqui.