domingo, 31 de julho de 2011

Sodoma e Gomorra

Ofereço um pedaço do meu corpo antes de partir, nao quero dar a impressão de ser mal educada, estão todos congelados - os alpinistas - mas a sua carne eu ainda me recuso a comer. Da festa sobram pernas e braços e brigadeiros e bagaços que não me incomodo em reciclar, junto latas de alumínio apenas para ouvir seu tilintar, balanço os sacos de lixo para declamar o choque metálico, como poesia, versos feitos de barulho e de metal, o faço também para que não pensem que carrego cadáveres, ouço gritos de criança ou sirenes de ambulância, não sei mais diferenciar.
Mordi a língua tão forte que até agora não parou de doer, vai nascer uma afta, tenho certeza, melhor aproveitar para comer tudo o que tiver de salgado enquanto espero a erosão acontecer, é como faz minha avó, procura sentar nos lugares mais desconfortáveis que consegue encontrar até surgirem as hemorróidas que estouram no fim de cada mês, é melhor sentir falta de algo sabendo que muito dele já fez, sabe lá quando você vai sentir vontade de andar de carrosel ou descansar a bunda sobre canos de cobre, não vale a pena prevenir a hipertensão e viver uns anos a mais sem poder jantar na rua, sem correr em casa, nua, sem o prazer do pecado da gula.
Com a boca rachada, parece que jamais vou sentir qualquer gosto novamente, a inflamação não me permite enxergar a transitoriedade da doença e o tempo que ela demora a desaparecer acaba tornando a dor uma coisa normal. De vez em quando, é verdade, penso em olhar para trás e me deixar transformar em estátua de sal.

3 comentários:

  1. Muito bom, menine.

    Um Rubem Fonseca mais novo e feminino.

    Beijos.

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  2. Seu despontar literário é qualquer coisa de fantástico e vc é uma sumidade em sua geração.
    Potencial em erupção que dá gosto de se ler e de sentir.
    Parabéns.

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  3. Mentira! voce nao é tudo isso nao. fica ligadin

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