sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Insensata coxinha

Memória aleatoriamente selecionada pela mente ociosa que não me sai da cabeça. A menina que tirava o frango de dentro das coxinhas antes de comer. Todo intervalo ela comprava uma generosa quantidade de coxinhas (muito mais do que eu conseguia comprar em bolinhas de queijo com meus três reais da merenda) e sentava no canto do corredor enquanto conversávamos para dissecá-las, dilacerá-las, tirar o que as tornava coxinhas.
Confesso que ficava com raiva. Falava mal do seu jeito de comer coxinhas pelas costas e toda vez sugeria que comprasse outro salgadinho já que, obviamente, não gostava de coxinhas. Ela insistia que gostava do sabor que o frango deixava na massa da coxinha. Inaceitável, na minha opinião. Você tem que amar a coxinha por tudo o que ela é, não pode simplesmente pegar sua casquinha crocante e desprezar seu conteúdo macio e talvez não tão apetitoso. Além dessa nada inspiradora metáfora, eu tinha raiva porque era meio nojento, imagine os frangos espalhados, deixando o papel e os dedos engordurados, de forma que, toda vez que destruía uma nova coxinha, ela esfregava o frango que ia ser desprezado na borda do saquinho e em seguida lambia os dedos, criando um ciclo de frango, gordura e saliva nada atraente de se observar. Eu sentia que não era obrigada a presenciar tal cena impublicável em um momento tão etéreo do dia quanto a hora do recreio.
Além disso, nessa época da minha vida eu ainda não tinha aprendido a me apaixonar pelas esquisitices de cada um. Não que olhando para trás agora eu me consiga definir isso como uma mania charmosa, claro, mas esse é um caso muito particular, na maioria das vezes consigo sim transformar TOC em charme. Enfim, você só aprende a amar o próximo pelos seus pequenos defeitos depois de uma determinada cota de bullying que sofre na vida e, na quarta série do fundamental, eu estava do outro lado do palco do sofrimento escolar, inventando apelidos e colando papel cartão em mochilas alheias.
Pois é, nessa época, se eu fosse uma coxinha, eu seria aquela última da bandeja, que estava tão apetitosa quanto as outras mas que, como ninguém comeu, ficou murcha e perdeu o dourado cativante que faz com que as pessoas queiram comprá-la.
No ginásio eu estava num estágio mais avançado ao de uma coxinha murcha, eu me tornei um risole de fim de festa. E foi então que aprendi a observar mais as pessoas. Foi então que aprendi a me apaixonar exatamente por tudo aquilo que se tornava motivo de piadas para os outros pré-adolescentes sedentos por uma humilhação pública. Foi então que comecei a não julgar alguém apenas por achar estranho a forma como lida com suas coxinhas.
Não é justo rir por detrás de portas de madeira, não é decente definir o sentido de ausência como padrão para todos. Talvez a falta do frango fosse a plenitude da sua coxinha, e talvez eu até esteja falando isso sem um pingo de ironia...
Ou talvez eu esteja superanalisando um comportamento mimado de filha única de colégio particular da zona sul do rio de janeiro como algo realmente digno de sequer ser analisado. Enfim, eu teria comprado bolinhas de queijo.

10 comentários:

  1. Putz eu comia o frango q minhas amigas não queriam das coxinhas delas..how sad is that? =[
    É q minha mãe qse nunca me dava dinheiro p/ lanche pq "tem um monte coisa em casa p/ levar"¬¬

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  2. da ca um abraço que você é muito boa :)

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  3. Vou comprar uma coxinha pra tirar o frango de dentro agora.

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  4. Absolutamente impressionante ,interessante.
    como vc escreve.
    Essa da coxinha é um exagero de bom gosto boa escrita para se ler, se deliciando.
    Parabéns para as coxinhas e parabéns paa vc, grande intelectual UAU....UAU....UAU....

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  5. sugiro que vc conte uma historia de bolinho de baunilha

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  6. nunca faria isso com uma coxinha

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  7. O será q a menina buscava nas entranhas?

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  8. Vc é uma escritora nata, perfeita

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  9. Eu como coxinha sem frango até hoje. Muito bom o texto! :)

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