A gente disse adeus e não quis se levantar. Por algum motivo,
sabíamos que essa seria a última vez. Já nos despedimos tantas vezes,
mas só naquele momento pareceu um adeus de verdade, e era difícil
levantar, o banco de pedra nos puxava para baixo, ao menos eu sentia que
me puxava, não sei se você também o sentia puxar ou se era eu quem
estava usando a força do banco para te manter ali, não o banco; eu estou
feliz, você disse, e o banco pesou ainda mais, não está, eu respondi, e
o meu rosto queimou de vergonha por apontar a sua infelicidade, você
estava amando e não estava feliz, era melhor então não amar, eu queria
ter dito, mas fiquei calada, a gente precisava mentir para poder se
levantar.
As pessoas que jogavam dominó na praça te olhavam
chorar, será que elas estão ouvindo o que eu estou dizendo?, você
perguntou, as pessoas não resistem às lágrimas, precisam olhar, precisam
saber dos nossos motivos, dos nossos machucados, das nossas escolhas
erradas. Olha para mim, e você não olhava, olha para mim, e você não
olhava, por
favor, eu disse, e você me mostrou a cara inchada e vermelha, estava
triste por pena de mim, pensei, achei que nessa hora você ia se levantar
para me dar um abraço, mas imagino que o banco pesado demais tenha te
prendido no lugar. Era a nossa última escolha, não é uma escolha, você
disse, mas era a nossa última escolha. Eu segurava a sua mão e você
usava a mão que eu tinha escolhido segurar para limpar o rosto, eu
fingia não perceber e segurava a sua mão outra vez, você já tinha ido
embora, todas as outras vezes já tinha ido embora, mas a sua mão ficava
ali, eu podia segurar sua mão para sempre, mesmo depois da última
despedida, mesmo quando você não existisse mais, eu podia segurar o
fantasma da sua mão, eu ainda tinha medo de você morrer sem eu saber.
Tinha
medo de você morrer longe, na sua nova casa, tinha medo de que o seu
novo amor te vestisse com roupas brancas e te colocasse em um caixão de
madeira e eu continuasse segurando a sua mão, tinha medo de passar anos
segurando a mão de um cadáver e não perceber seus ossos decompondo-se
dentro dos meus dedos fechados, precisava abrir a mão que segurava a sua
e te deixar ir embora, precisava deixar você levantar depois do nosso
último adeus, precisava te deixar morrer daqui a vinte minutos ou
sessenta anos, algum dia você irá deixar de existir de qualquer maneira,
eu precisava deixar você existir do jeito que você escolheu, não é uma
escolha, você repetiu, a última escolha nunca parece uma escolha.
demais!
ResponderExcluirSensacional!! "A última escolha não parece uma escolha."
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